O Arroz de Casca

quinta-feira, março 01, 2007

Acaso


Antes de acabar com aquela teimosia tonta, a teimosia que me consome, me corrói e que, muitas vezes, simboliza as minhas Dádivas, não conseguia arrumar os livros de poesia na estante. Por muito que soubesse - não tive coragem, até à estocada final. Uma espécie de superstição estúpida e batida, mas não consegui. Afinal era o sabor dos livros com que tinha tentado desflorar o teu amor pela poesia. E eram as letras, as linhas, os parágrafos que me tinham juntado à tua loucura mansa. Mas não há que confundir os homens (e as suas acções) com as suas obras - uma das primeiras lições de jornalismo que teimo em esquecer. No dia em que, finalmente, respirei fundo e «limpei a mesa», os livros apareceram - não por mim- arrumados na estante. Foi o Al Berto e o seu «Medo» (um título nada ao acaso nesta estória de letras), o Lorca e o Eugénio. Todos na estante. Curiosamente, em cima da secretária só restou um caderno verde de capa plástica da escola primária e o Herberto Helder e «Do Mundo». Vou lê-los porque devem ter alguma coisa para me ensinar: alguma coisa que eu desaprendi. Há quanto tempo lá estavam os livros? Uma eternidade - que é o tempo que dura qualquer dor.